sexta-feira, 20 de março de 2009

Poema Natalino de março (nostalgia ou futurismo?)

Raspas de Papai Noel

Todos os natais passei com febre.
Maldição que jesus vê.
Eu,que passo o ano tão alegre
visto o jeans,
pra se chover.
[Então porque?
Rabanadas,
me levem pra ontem!
Há pinhas na sala!
Os presentes se rasgam sem mão.

Há pinhas na sala!
Os presentes se rasgam sem mim

Vaga,a noite de
Getúlio Vargas
rosto preto e costas largas
caindo encima de mim!

Mas do escuro é que se mama a fome
e quando o mais crioulo some
é que se toca Tom Jobim.

e se baila ao longe o abutre triste
na mais longe estrela,exilada
existe
rastros de papai noel!
raspas de papai noel!

Ferreira Gullar


No mundo há muitas armadilhas

e o que é armadilha pode ser refúgio
e o que é refúgio pode ser armadilha

Tua janela por exemplo
aberta para o céu
e uma estrela a te dizer que o homem é nada
ou a manhã espumando na praia
a bater antes de Cabral, antes de Tróia
(há quatro séculos Tomás Bequimão
tomou a cidade, criou uma milícia popular
e depois foi traído, preso, enforcado)

No mundo há muitas armadilhas
e muitas bocas a te dizer
que a vida é pouca
que a vida é louca
E por que não a Bomba? te perguntam.
Por que não a Bomba para acabar com tudo, já
que a vida é louca?

Contudo, olhas o teu filho, o bichinho
que não sabe
que afoito se entranha à vida e quer
a vida
e busca o sol, a bola, fascinado vê
o avião e indaga e indaga

A vida é pouca
a vida é louca
mas não há senão ela.
E não te mataste, essa é a verdade.

Estás preso à vida como numa jaula.
Estamos todos presos
nesta jaula que Gagárin foi o primeiro a ver
de fora e nos dizer: é azul.
E já o sabíamos, tanto
que não te mataste e não vais
te matar
e agüentarás até o fim.

O certo é que nesta jaula há os que têm
e os que não têm
há os que têm tanto que sozinhos poderiam
alimentar a cidade
e os que não têm nem para o almoço de hoje

A estrela mente
o mar sofisma. De fato,
o homem está preso à vida e precisa viver
o homem tem fome
e precisa comer
o homem tem filhos
e precisa criá-los

Há muitas armadilhas no mundo e é preciso quebrá-las.